O dia 04/09/2018 marcou o lançamento da campanha “Mero Aborrecimento tem Valor”, desenvolvida e aderida por todo o sistema nacional da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.
Idealizada no ano de 2016 pelo Conselho Federal, essa proposta objetiva o debate e a reflexão aprofundada acerca da aplicabilidade prática das diretrizes consagradas pelo Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista o entendimento reiteradamente difundido pelo Poder Judiciário de que certas lesões ocasionadas à consumidores caracterizam tão somente um mero aborrecimento.
Segundo esse entendimento, embora por vezes caracterizado o defeito no fornecimento do produto ou na prestação do serviço, não haveria motivação suficiente que ensejasse a condenação dos fornecedores em reparar o prejuízo moral ocasionado aos consumidores. Alega-se que o dano moral não se compõe estritamente pela dor, vexame, sofrimento e vergonha, sendo tais sentimentos inerentes aos dissabores cotidianos enfrentados por qualquer pessoa.
Ao que me parece, a vertente acima mencionada, que norteia o estudo do dano moral, vislumbra essencialmente evitar um enriquecimento injustificado por via desse instituto, fenômeno este corriqueiramente chamado de “indústria do dano moral”.
Contudo, não obstante ao apreço que merece essa preocupação e limitação imposta à utilização do dano moral, notadamente no âmbito consumerista visualiza-se que essa corrente vem provocando efeitos extrínsecos àqueles outrora idealizados. Isso porque, fornecedores de produtos e prestadores de serviços se valem desses precedentes para mascarar a precariedade de atuação em suas respectivas atividades, ou seja, não realizam investimentos mínimos para qualificar o atendimento dos seus consumidores, ancorados na certeza de impunidade que recairá sobre suas condutas.
Trata-se em grande parte de empresas de elevado poderio financeiro, que cometem vícios triviais em prejuízo à consumidores, cujos problemas seriam facilmente evitados com a implementação de infraestrutura para qualificar a atividade e os profissionais nela envolvidos. No entanto, essas instituições optam pela restrição de investimentos nesses setores, visando unicamente atingir níveis de lucro cada vez maiores.
Por seu turno, conquanto o Direito Brasileiro não admita o caráter punitivo do dano moral, o Superior Tribunal de Justiça, com precedente exemplificativo no REsp. 838.550/RS, entende que ao fixar o valor da indenização o juiz deve considerar o seu caráter pedagógico.
Nesse sentido, ao meu ver, a proposta apresentada pela campanha da OAB pretende ampliar o número de condenações indenizatórias à título de danos extrapatrimoniais, com o intuito de atribuir uma efetiva proteção prática aos consumidores e, ainda, compelir os fornecedores de produtos e prestadores de serviços a otimizarem suas respectivas áreas de atuação, sob pena de sofrerem “sanções” decorrentes dessa desídia.
Em que pese essa possível incoerência entre caráter punitivo e caráter pedagógico do dano moral, acredito que a medida seja válida, especialmente sob a égide do Direito do Consumidor, ao passo que incentivaria o aprimoramento das relações de consumo, evitaria novas situações problemáticas e propiciaria, quem sabe, uma redução do número de demandas desse tipo no sistema judiciário.
Não sabemos ao certo se essa medida surtirá efeitos a curto ou médio prazo no entendimento atualmente vigente na maioria das decisões proferidas pelo Judiciário, porém, como entusiasta da ampliação e efetiva implementação dos direitos dos consumidores, vejo como positiva a iniciativa de propositura da campanha, incentivando-se, destarte, o aumento dos debates sobre esse tema tão relevante para todos.
Roberto Zandoná Junior